(Da
série “Como João Guimarães Rosa pode mudar sua vida”, parte 30)
- “Mataram Joca
Ramiro!...”
Diadorim se
desespera. Riobaldo ainda não sabe, mas Joca Ramiro é pai de Diadorim.
“Aí estralasse
tudo – no meio ouvi um uivo doido de Diadorim”:
“Diadorim tinha
caído quase no chão, meio amparado a tempo por João Vaqueiro. Caiu, tão pálido
como cera do reino, feito um morto estava. Ele, todo apertado em seus couros e
roupas, eu corri, para ajudar. A vez de ser um desespero. O Paspe pegou uma cuia
d’água, que com os dedos espriçou nas faces do meu amigo. Mas eu nem pude dar
auxílio: mal ia pondo a mão para desamarrar o colete-jaleco, e Diadorim voltou
a seu si, num alerta, e me repeliu, muito feroz. Não quis apoio de ninguém, sozinho
se sentou, se levantou. Recobrou as cores, e em mais vermelho o rosto, numa
fúria, de pancada. Assaz que os belos olhos dele formavam lágrimas. Titão
Passos mandava, o Gavião-Cujo falava. Assim os companheiros num estupor. Ao que
não havia mais chão, nem razão, o mundo nas juntas se desgovernava.
– “Repete,
Gavião!”
– “Ai, chefe, ai,
chefe: que mataram Joca Ramiro...” –
“Quem? Adonde?
Conta!”
“Antes mais, o
pobre Diadorim. Alheio ele dava um bufo e soluço, orço que outros olhos, se
suspendia nas sussurrosas ameaças. Tudo tinha vindo por cima de nós, feito um
relâmpago em fato.”
– “... Matou foi o
Hermógenes...”
– “Arraso, cão!
Caracães! O cabrobó de cão! Demônio! Traição! Que me paga!...” – constante não
havendo quem não exclamasse. O ódio da gente, ali, em verdade, armava um pojar para
estouros. Joca Ramiro podia morrer? Como podiam ter matado? Aquilo era como
fosse um touro preto, sozinho surdo nos ermos da Guararavacã, urrando no meio
da tempestade.”
– “... O
Hermógenes... Os homens do Ricardão... O Antenor... Muitos...”
“Aquilo foi à
traição toda. Morreram os muitos, que estavam persistindo lealmente.”
E todos iam se
reunir, para a vingança contra Hermógenes e Ricardão. Era outra guerra, agora.
E Diadorim sofre.
“Que o Hermógenes
e o Ricardão de muito haviam ajustado entre si aquele crime, se sabia. O
Hermógenes distanciou Joca Ramiro de Só Candelário, com falsos propósitos,
conduziu Joca Ramiro no meio de quase só gente dele, Hermógenes, mais o pessoal
do Ricardão. Aí, atiraram em Joca Ramiro, pelas costas, carga de balas de três
revólveres... Joca Ramiro morreu sem sofrer. – “E enterraram o corpo?” –
Diadorim perguntou, numa voz de mais dor, como saía ansiada. Que não sabia-o
Gavião- Cujo respondeu; mas que decerto teriam enterrado, conforme cristão, lá
mesmo, na Jerara, por certo. Diadorim tanto empalidecesse; ele pediu cachaça.
Tomou. Todos tomamos. Titão Passos não queria ter as lágrimas nos olhos. – “Um
homem de tão alta bondade tinha mesmo de correr perigo de morte, mais cedo mais
tarde, vivendo no meio de gente tão ruim...” – ele me disse, dizendo num modo
que parecia ele não fosse também jagunço, como era de se ser. Mas, agora, tudo
principiava terminado, só restava a guerra. Mão do homem e suas armas. A gente
ia com elas buscar doçura de vingança, como o rominhol no panelão de calda.
Joca Ramiro morreu como o decreto de uma lei nova.”
E pela primeira
vez cogitam que Riobaldo assuma a chefia do bando. Mas ele recusa.
“ – “Mano velho
Tatarana, você sabe. Você tem sustância para ser um chefe, tem a bizarria...” –
no caminho o Alarípe me disse. Desmenti. De ser chefe, mesmo, era o que eu tinha
menos vontade.”
O bando se reúne
com outros também dispostos à guerra e à vingança. E começa a caçada à
Hermógenes. Mas até parece que o diabo o faz escapar da tentativa de cerco que
armaram, despercebido. E os soldados chegam pra dar combate, complicando tudo.
São muitos os confrontos com os praças. E Hermógenes se distancia.
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