(Da
série “Como João Guimarães Rosa pode mudar sua vida”, parte 12)
“A tristeza. Aí, o Reinaldo,
na paragem, veio para perto de mim. Por causa da minha tristeza, sei que de mim
ele mais gostava. Sempre que estou entristecido, é que os outros gostam mais de
mim, de minha companhia. Por quê? Nunca falo queixa, de nada. Minha tristeza é
uma volta em medida; mas minha alegria é forte demais. Eu atravessava no meio
da tristeza, o Reinaldo veio. Ele bem-me-quis, aconselhou brincando: – “Riobaldo,
puxa as orelhas do teu jumento...” Mas amuado eu não estava. Respondi somente: –
“Amigo...” – e não disse nem mais. Com toda minha cordura. Mas, de feito, eu
carecia de sozinho ficar. Nem a pessoa especial do Reinaldo não me ajudava.
Sozinho sou, sendo, de sozinho
careço, sempre nas estreitas horas – isso procuro. O Reinaldo comigo par a par,
e a tristeza do medo me eivava de a ele não dar valor. Homem como eu, tristeza
perto de pessoa amiga afraca. Eu queria mesmo algum desespero. Desespero quieto
às vezes é o melhor remédio que há. Que alarga o mundo e põe a criatura solta.
Medo agarra a gente é pelo enraizado. Fui indo. De repente, de repente, tomei
em mim o gole de um pensamento – estralo de ouro: pedrinha de ouro. E conheci o
que é socorro.”
Existem alegrias
e tristezas boas e más.
A boa
alegria diz respeito ao envolvimento com a vida. E como tudo que é vital é em
aberto e encontra-se em transformação, a boa alegria diz respeito a abertura
para o novo, à descoberta, à graça diante daquilo que se apresenta para nós e
diante daquilo que conseguimos construir. A boa alegria diz respeito ao gozo
genuíno do prazer de viver.
Ou, como
diria Riobaldo, “O senhor tenha na ordem seu quinhão de boa alegria, que até o
sertão ermo satisfaz.”
A má
alegria é como uma euforia desmedida e auto-suficiente. Ela diz respeito aos
nossos desejos de onipotência e de perfeição, aos nossos desejos de nunca errar
e sempre estarmos certos. A má alegria é um tipo de hipomania cobiçosa convencional,
na qual nos convencemos que estamos sempre certos e apressados, passamos ao
largo da realidade, sem nada ver.
A má
tristeza diz respeito à cólera desesperada, à magoa antiga, ao ressentimento velho e ao rancor mofado. A
má tristeza é projetiva e supõe que os outros, e somente eles, é que são
responsáveis pelos problemas que temos, se alimentando da embriagante
lamentação. A má tristeza procura culpados e não soluções, por vezes até foge
das soluções. A má tristeza não leva à compreensão.
O filme “Hiroxima,
meu amor” retrata uma boa metáfora da má tristeza quando a atriz principal, ao
narrar o enorme sofrimento pelo qual passou durante a Segunda Guerra, vai
afundando na dor e na lamentação e por pouco não enlouquece novamente. A má
tristeza nos ensina que a dor deve ter sua medida ou nos afogaremos em nossas próprias
lágrimas.
A boa
tristeza diz respeito ao momento de parada, quando precisamos reavaliar nossos
projetos e mudar de direção. A boa tristeza está relacionada à percepção do
erro como um elemento de aprendizagem e de aproximação da realidade. A boa
tristeza acontece quando compreendemos que as coisas não transcorreram como
gostaríamos, mas que agora, diante da clara realidade que se apresenta, podemos
finalmente caminhar com os pés no chão. A boa tristeza leva à compreensão.
Na maior parte das vezes essas tristezas e alegrias
se apresentam bem misturadas.
Mas, como diria Riobaldo...
“A
gente vive, eu acho, é mesmo para se desiludir e desmisturar.”
Um comentário:
Nello.Boa Tarde,eu tava precisando ler este texto hje p.desmisturar as 2 tristezas.rs.bjo.M.clara
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