São dois os pilares da inteligência emocional: a autoconsciência processual e a soberania.
A autoconsciência processual pode
ser explicada da seguinte forma:
Primeiro, tenho que saber de mim. Tenho que saber o
que sinto, o que me motiva, os valores que me orientam. Isso pode parecer
obvio: é claro que sei de mim mesmo. Mas não é. Na verdade, nos enganamos a
respeito de nós mesmo muitíssimas vezes. Não sabemos o que sentimos, pois não podemos
admitir sentir certas coisas. Acabamos por afirmar sentir o que na verdade não sentimos.
Agimos sem saber com clareza porque agimos, num automatismo irrefletido, sem
ter claro nem os elementos motivadores reais, nem os valores que orientam as
nossas ações. Enfim, tenho que ultrapassar essas barreiras do autoconhecimento
e saber de mim.
A crença de que as emoções são perigosas e
desestabilizadoras, que quando deixarmos nossas emoções aflorarem perderemos o
controle, é prejudiciais para a inteligência emocional. Não censurar o que se
sente é necessário para uma boa consciência de si. A pessoa com inteligência emocional
lida bem com o que sente, mesmo que seja muito intenso esse sentir.
Se souber de mim, por isso mesmo, saberei melhor do
outro. Sabendo realmente o que sinto, penso e valorizo, consigo identificar
muito melhor o que o outro pensa, sente e valoriza. O pensamento é social, os
sistemas simbólicos que nos preenchem e orientam são sociais. Sabendo de mim
vejo com mais clareza quem é esse outro, tenho maior facilidade de me colocar,
em pensamento, no lugar dele. E assim imaginar seus sentimentos, motivações e
valores.
Se, com consistência, sei de mim e sei do outro,
tenho, por fim, de saber o que fazer com isso. Uma vez que sei o que está
acontecendo comigo e tenho uma boa consciência do que está acontecendo com o
outro, minhas chances de saber lidar com a relação que se estabelece entre eu e
o outro aumentam. Posso realmente compreender o outro e me fazer compreender
pro ele, com muito mais acurácia do que quando estou me relacionando no
automatismo irrefletido típico do dia a dia de todos nós.
Resumindo, o primeiro pilar é: saber de mim, por
isso mesmo, saber do outro e por fim saber o que fazer com isso.
Um exemplo pertinente de autoconsciência processual
é a chamada comunicação assertiva, excelente opção para as situações nas quais
a comunicação encontra-se obstruída.
Nas situações onde a comunicação encontra-se
obstruída ou parece direcionar-se para o conflito, três atitudes são comumente encontradas.
A primeira é chamada de atitude passivo-agressiva.
Nesta o medo do conflito impera e todos os esforços são no sentido de evitá-lo.
Mente-se, combinam-se coisas que se sabe de antemão que não serão feitas,
fala-se mal por trás, mas pela frente em tudo se concorda. Mas nada do acordado
será feito. É, de longe, a atitude mais comum. Cerca de 80% das pessoas
portam-se desta forma.
A segunda é a atitude agressiva. Essas pessoas
podem até comportar-se de maneira passivo-agressiva inicialmente, mas logo
perdem a cabeça e partem para o ataque. Xingam, esbravejam ou se retiram de maneira
afrontosa. Há o senso comum de que os agressivos pelo menos “botam para fora” e
por isso se desgastariam menos que os passivo-agressivos, que engolem qualquer
coisa pra evitar um desentendimento. Ledo engano. Os índices de estresse e até
de ataques cardíacos dos dois grupos são semelhantes. De 10 a 15 % das pessoas pertencem
a esse grupo.
Esses dois tipos anteriores normalmente não
conseguem desobstruir a comunicação.
Por fim, há a terceira atitude, os assertivos.
Normalmente começam a tentar comunicar com um elogio verdadeiro, ressaltando
algum aspecto positivo do interlocutor ou da relação. Em seguida falam da
dificuldade em questão, de maneira clara e precisa, sem procurar culpados pelo
problema, mas sim procurando saídas e soluções. O núcleo dessa comunicação,
apesar de se caracterizar pela precisão nos argumentos, é emocional. É
emocional no gestual do elogio verdadeiro: o olhar, o tom de voz, os gestos e
atitude. Mas também costuma ser
emocional no conteúdo, quem comunica de maneira assertiva costuma dizer o que
está sentindo no momento. Talvez o faça intuitivamente, sabendo que não cabe contestação
quando dizemos que nos sentimos tristes ou frustrados frente a tal situação. Os
assertivos não costumam passar de 5% das pessoas.
Mas a boa notícia é que se pode aprender a ser
assertivo.
Eu chamava a comunicação assertiva, antes de
descobrir esse conceito, de comunicação surpreendente. O interlocutor espera
que venha um inimigo e esse não aparece. E nessa surpresa a brecha comunicativa
acaba por se revelar.
O segundo pilar da inteligência emocional é a
soberania. Soberania é a junção da liberdade, que é poder escolher o que se
quer fazer, com a independência, que é poder escolher o que não se quer fazer.
Quem é soberano não é manipulado, nem quando é
intimidado, nem quando é provocado, nem quando é tentado, nem quando é
seduzido. Uma
vez manipulado o sujeito como que perde a sua qualidade de sujeito, renunciando
a sua soberania, ou seja, renunciando a sua liberdade e a sua independencia. O
comportamento impulsivo, aparentemente irrefletido, onde o sujeito somente
reage a algo, e nao realmente age (A ação verdadeiramente humana pressupõe a
inteligencia verdadeiramente humana, ou seja, a capacidade de esperar que a
realidade se manifeste por inteiro para, aí sim, escolher o curso de ação que
se deseja) também reflete a falta de soberania assim como evidencia que o
sujeito foi manipulado.
Podemos perceber que estamos ganhando em soberania
quando percebemos aumentar a nossa capacidade de auto-motivação. Quando caímos,
quando ficamos frustrados, quando desiludidos ou decepcionados, é nessa hora
que podemos perceber se conseguimos nos auto-motivar. E um bom critério para
verificar a nossa auto-motivação é o tempo que levamos para sentir o baque,
achar que não tem mais jeito e, devagarzinho, ir aceitando as novas condições
da realidade e buscando alternativas dentro dessas novas condições.
Quem é soberano tem a capacidade de se auto-motivar,
auto-regular, auto-cuidar, parar. Que é diferente de ser autossuficiente, uma
vez que nunca sou soberano isoladamente, mas sou soberano entre as pessoas. Todos
nós necessitamos da convivência, do amor, do encontro. E isso não reduz em nada
a nossa soberania.
3 comentários:
Excelente texto! Os conceitos foram postos de forma bem clara e didática.
E será que podemos reunir as três atitudes (passivo-agressiva; agressiva e assertiva)em nós mesmos, dependendo do momento de nossas vidas quando a comunicação estiver obstruída ou tendenciosa ao conflito?
Isto é, em determinado momento da vida eu me comporto de maneira agressiva. Num outro momento, de maneira passivo-agressiva, pois quero evitar o conflito. Quando estou mais tranquila, ajo de maneira assertiva.
É assim mesmo, Maria Januário... Mesmo que algum prepondere, temos os três como possibilidade a cada dia.
Postar um comentário