“Quando
os virtuosos - os filósofos, os que acreditam que sabem o que é bom e o que é
mal - tomam o poder, instauram a tirania mais insuportável: a dos justos.”
Octávio Paz, citando Chuang-Tzu.
O trecho acima foi retirado da matéria "Um chinês contra a tirania" publicada na Folha de São Paulo, em 21 de abril de 1988, de autoria de Octávio Paz.
O trecho acima foi retirado da matéria "Um chinês contra a tirania" publicada na Folha de São Paulo, em 21 de abril de 1988, de autoria de Octávio Paz.
"Chuang-Tzu ataca os moralistas. O arquétipo do moralista é Confúcio. Sua moral é a do equilíbrio social; seu fundamento é a autoridade dos seis livros clássicos, depositários do saber de uma mítica idade de ouro em que reinavam a virtude e a piedade filial. A virtude (jen) era concebida como um composto de benevolência, retidão e justiça, encarnação ao culto do imperador e dos antepassados. A ação do sábio, essencialmente política, consistia em preservar a herança do passado e, assim, manter o equilíbrio social. Este, por sua vez, era só o reflexo da ordem cósmica. Cosmologia política. Nós, em espanhol, temos uma palavra que da uma certa idéia do termo chinês: fidalguia. Mas o fidalgo é um cavalheiro; venera o passado, mas não vê nele um principio cósmico nem uma ordem fundada no movimento da natureza. O discípulo de Confúcio é um mandarim: um letrado, um funcionário e um pai de família.
O caráter utilitário e conservador da filosofia de Confúcio, seu respeito supersticioso pelos livros clássicos, seu culto à lei e, sobretudo, sua moral feita de prêmios e castigos, eram tendências que inspiravam repugnância a um filósofo-poeta como Chuang -Tzu. Sua crítica à moral foi também uma crítica ao Estado e ao que comumente se chama o bem e o mal. Quando os virtuosos -os filósofos, os que acreditam que sabem o que é bom e o que é mal- tomam o poder, instauram a tirania mais insuportável: a dos justos. O reino dos filósofos, nos diz Chuang-Tzu, se transforma fatalmente em despotismo e terror. Frente a essa sociedade de justos e criminosos, de leis e castigos, Chuang-Tzu postula uma comunidade de ermitãos e de gente simples. A sociedade de sábios rústicos. Nela não há governo nem tribunais nem técnica; ninguém leu um livro, ninguém quer ganhar mais do que o necessário, ninguém teme a morte porque ninguém ninguém pede nada à vida. A lei do céu, a lei natural, rege os homens como rege a mudança das estações. A sociedade de Confúcio, imperfeita como todo ser humano, se realizou e se converteu no ideário e no padrão ideal de um império que durou 2.000 anos. A sociedade de Lao-Tzu e de Chuang-Tzu é irrealizável, mas a crítica que os dois fazem à civilização merecem a nossa simpatia. Nossa época ama o poder, adora o êxito, a fama, a eficácia, a utilidade e sacrifica todos os seus ídolos. É consolador saber que, há 2.000 anos, alguém pregava o contrário: a escuridão, a insegurança, e a ignorância, ou seja, a sabedoria e o não o conhecimento.
Na terceira seção procurei agrupar alguns textos sobre o que poderia ser chamado o homem perfeito. O sábio, o santo, é aquele que está em relação, em contato, com os poderes naturais. O sábio realiza milagres porque é um ser em estado natural e só a natureza é quem realiza milagres. Mas é melhor ceder a palavra a Chuang-Tzu."
O DIALÉTICO
Utilidade da inutilidade
Hui-Tzu disse a Chuang-Tzu: "Seus ensinamentos não tem nenhum valor prático". Chuang-Tzu respondeu: "Só os que conhecem o valor do inútil pode falar do que é útil. A terra sobre a qual pisamos é imensa, mas essa imensidão não tem valor prático: a única coisa que precisamos para caminhar é o espaço que cobre as nossas plantas. Suponha que alguém perfura o solo em que pisamos, até cavar um enorme abismo que chegasse até a Fonte Amarela: teriam algum valor os dois pedaços de terra sobre os quais se apóiam nossos pés?". Hui-Tzu retrucou: "Realmente seriam inúteis". O mestre concluiu: "Logo, é evidente a utilidade da inutilidade."
Sobre a linguagem
"Vejamos o que acontece com as palavras", disse Chuang-Tzu, parodiando os lógicos e dialéticos. "Não sei quais entre elas estão em relação direta com a realidade que pretendem nomear e quais não estão. Se algumas estivessem e outras não, pode concluir-se que as primeiras seriam indistinguíveis das últimas. A título de prova, direi algumas palavras: se houve um princípio, houve um tempo anterior ao princípio do princípio, em consequência, houve um tempo anterior ao tempo anterior ao princípio, que por sua vez... Se há ser, há o não ser; se houve um tempo antes do ser começar a ser, também houve um tempo antes do tempo antes do não-ser começar a ser.... poderia continuar assim, quando nem sequer sei com certeza se o ser é o que é, e o não-ser é o que não é. Dessa maneira continuaríamos até chegar ao ponto em que um matemático -para não chegar a uma pessoa comum e corrente como eu- teria dificuldade em seguir-nos.
Por fim, lembrei-me deste texto, de autor desconhecido:
“Julgar é o esporte predileto das pessoas honestas. Faz com que se sintam justas e demarquem um nítido limite entre os inocentes e os culpados. Confesso que este jogo não me tenta.”
2 comentários:
Nello, como posso t contactar como pscicólogo?
contacte-me no facebook, nello rangel, e damos um jeito... qual é o seu nome?
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