quinta-feira, 20 de março de 2014

Meu menino, ino, ino

1

Dos versos que exprimem,
Estou cansado!

Das palavras que explicam,
Estou cansado!

Ai, embala-me, fútil, e frágil, no ó-ó dos teus versos,
Ai, encosta-me ao peito...!

Mais não quero que ser embalado.


2

O menino está doente...
-- Diz a mãe.

Qui-é qui-é
Que o menino tem?

Ai...!
Diz o pai.

A criada velha chora pelos cantos
E reza a todos os santos...

Afirma o senhor doutor
Que amanhã que está melhor.

O pai suspira:
-- Quem sabe lá?!

E o menino diz:
-- Papá...!

A mãe chora:
-- Quem já me dera amanhã!...

E o menino diz:
-- Mamã...!

E, com a febre, rezinga,
E choraminga,
Olhando a lua amarela
Como uma vela:
-- Quero aquela péla...!

Mas o Pai do Céu sorri:
-- Vem cá vê-la!
É para ti.


3

-- Acabaste?

-- Meu amor, acabei.

-- Apagaste a candeia? apagaste?

-- Meu amor, apaguei.

- E fechaste o postigo? e fechaste?

- Meu amor..., sim, fechei.

-- Que rumor é aquele? não sentes?

-- Meu amor, que te importa?
É a vida a dar socos na porta.
É lá fora. São eles. É o mundo. São gentes.

-- São gentes? Quem são?

-- São colegas, amigos, parentes...

-- Vai dizer-lhes que não! Vai dizer-lhes que não!

José Régio,
As Encruzilhadas de Deus

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